sexta-feira, 13 de abril de 2012

Continentes !

Tempos de crise, ouve-se dizer um pouco por todo o lado.
Pelo menos, neste nosso lado.
A temática do desconcerto do Mundo é recorrente e comum a todas as épocas.
Atente-se no génio de Camões, para melhor perceber a perenidade do tema:

Os bons vi sempre passar
No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só pera mim,
Anda o Mundo concertado




Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o Mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades. 

Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança;
do mal ficam as mágoas na lembrança,
e do bem (se algum houve), as saudades. 

O tempo cobre o chão de verde manto,
que já coberto foi de neve fria,
e, enfim, converte em choro o doce canto. 

E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto,
que não se muda já como soía


 Pois é, até a própria mudança, já não muda como seria expectável que mudasse. 
 Bem isto já escrevia Camões nos idos de quinhentos.
 Mas continua obviamente atual. Porque a vida é na sua própria essência, alteração, dinâmica e mudança. O ser humano enquanto entidade individual é que não parece ter pedalada para a acompanhar. Digamos que somos assim um pouco para o conservador, ou pelo menos, para o situacionista... Não apreciamos especialmente as mudanças, gostamos de saber com o que contar. Infelizmente tal não parece ser sempre possível, e constitui-se até como condição indispensável à evolução.

  Troquemos-lhe então as voltas. Pois quantas vezes não nos parece que o Mundo está todo ao contrário ?

 


 Quase nem o reconhecemos. Mas a verdade é que é o nosso Mundo. Ele mesmo. E nem sequer está ao contrário. A verdade é que é uma visão tão válida como outra qualquer. O problema está mesmo no observador. Do princípio da impenetrabilidade dos corpos, que diz basicamente que dois corpos  diferentes não podem ocupar em simultâneo o mesmo espaço, resulta de imediato que " eu vejo daqui e tu vês daí". É incontornável, pelo menos neste nosso mundo macroscópico, que no mundo quântico a coisa fia mais fino ...
 Porque estranhamos então tanto assim esta disposição do mapa ?


 Bem primeiramente, atente-se na linha do equador. É que o chamado diálogo norte-sul não é  apenas mera retórica. Existe de facto muito mais área habitável, terra portanto, no que chamamos norte do que no sul. Só por isso, já faria sentido privilegiar o norte.
 Andar desnorteado! Perder o norte... andar perdido, andar sem rumo, sem discernimento. Por seu turno, andar dessuleado não parece já ter tão nefastas implicações...
 Depois, sendo o Oceano Pacífico o maior dos oceanos, não parece fazer assim muito sentido, colocar no centro dos planisférios, uma vasta região onde quase não vivem seres humanos, a que se junta o Alaska e a Sibéria, zonas também altamente desabitadas.


 Para além disso naturalmente, os fatores históricos, com o eixo das civilizações a deslocar-se paulatinamente do médio oriente sempre para ocidente, com o culminar da Europa a estabelecer pela primeira vez uma efetiva globalização ao colocar em contacto de uma forma regular e continua praticamente todos os pontos do globo, a que se seguiu um gradual domínio global europeu, potenciado sobretudo pela primeira revolução industrial, o que fez com que a visão eurocêntrica do mundo predominasse na representação mais comum do planisfério, ao mesmo tempo que se privilegiavam as regiões mais povoadas, como sendo as centrais.
 Andar desorientado! Não saber para onde ir, perder o rumo, estar confuso. Perder o oriente, significava perder a referência que se constituía como a plataforma comercial com que se obtinham bons proventos, rendimentos e riquezas. Provavelmente, agora que o eixo civilizacional está a retornar ao oriente, por lá passar-se-à a dizer - " vê lá se te ocidentas ! "...

 Porém a representação apresentada do planisfério, com a Ásia e o Pacífico na região central, tem a grande vantagem de colocar em evidência o facto nem sempre percebido, de que os continentes se constituem praticamente como um contínuo territorial. Efetivamente o continente que se encontra claramente afastado de todos os demais, é o que nem sequer costuma figurar nos mapas - referimo-nos à Antartida naturalmente. Terá sido essa a razão aliada ao extremo frio polar do sul, que fez com que fosse o último continente a ser conhecido e o último a ser habitado pelos seres humanos.


 Este quase continuo territorial das massas terrestres, faz com que contrariamente ao que possa parecer, a definição e delimitação dos continentes não seja tão linear quanto isso. Aliás, bastará recuar até ao pico da última glaciação, há cerca de 18 000 anos para verificar que praticamente todos as massas terrestres se encontravam ligadas, quer através do gelo que se formou, quer pelo consequente abaixamento do nível dos mares e oceanos que chegaram a baixar 120 metros, expondo muito mais terras.


 E não se pense que há 18 mil anos foi no tempo dos dinossauros, que não foi. Geologicamente foi ontem. Bastará ter em atenção que há 18 mil anos já Homo Sapiens nossos antepassados faziam arte em imensos locais como comprovam os testemunhos das gravuras e pinturas rupestres que nos legaram. Aliás, tanto a formação das imensas massas de gelo, algumas com mais de mil metros de altura como o consequente recuo dos mares e oceanos, ajudam a explicar e vieram a facilitar a fantástica colonização de todo o planeta que a nossa espécie levou a cabo.


 Repare-se só num pequeno exemplo que nos parece elucidativo, de como terá ficado a península itálica,


com a junção da Sardenha, da Córsega,  a união à atual Croácia, a junção à Sicília, a Malta e da quase total ligação a África. Então a Europa não seria muito diferente da imagem que se apresenta, com as principais  estações paleolíticas de homens neanderthais conhecidas.


  Repare-se na junção das duas metades da atual Turquia, que virá a dar mais tarde aquando do degelo,  à formação do estreito do Bósforo e do mar de Mármara, e ao irromper do Mar Mediterrâneo pelo Mar Negro, fazendo com as águas deste subam muito rapidamente num período de tempo muito curto ( 40 dias ? ), que ficará registado na História como o Dilúvio a que a Bíblia faz amplas referências.
 No pico da última glaciação ( sim que houve outras !...), os continentes apresentar-se-iam muito aproximadamente como a imagem reproduz, com as zonas escuras a indicarem as terras que foram postas a descoberto pelo abaixamento dos mares e oceanos, transformados em gelo, e que atualmente com a subida dos mares se encontram já submersas.


Torna-se visível que é sobretudo na zona do sudeste asiático que tais alterações tiveram consequências mais radicais, explicando-se assim como as atuais ilhas da região puderam ser alcançadas com alguma facilidade pelos seres humanos.

         

E claro, a junção da Ásia à América através da eliminação do atual estreito de Bering.



Bem, já que falamos da idade do gelo, não resistimos à tentação de apresentar uma espetacular imagem,


e um clássico de todos os tempos ...



  Ora esse quase continuo territorial que as massas continentais ainda hoje apresentam, não será de estranhar assim tanto, uma vez que ao longo da história geológica da Terra, por diversas vezes, todos os continentes se encontraram praticamente reunidos num único, sendo rodeados também consequentemente por um único oceano.


  E é aqui que a questão da mudança e do desconcerto do mundo vem entroncar. 
  Pois é verdade, a força da mudança é tal, que mesmo aquilo que damos como mais durável, perene e definitivo, como seja o chão que pisamos, até isso está sujeito a mudanças e alterações. Alterações lentas, quase impercetíveis, subtis mesmo, durante a vida de um ser humano. Mas no entanto, imparáveis e inexoráveis e com consequências dramáticas a muito longo prazo, fazendo mover continentes, elevar fundos marinhos até ao topo das mais altas montanhas, enrugar cordilheiras, afundar continentes. É só questão de deixar passar o tempo necessário a que tal possa suceder.
  
 Desde a sua formação há 4,5 mil milhões de anos, o nosso planeta no seu todo tem vindo continuamente a arrefecer. Todavia, fruto das enormes pressões que se fazem sentir no seu interior, e sobretudo da radiaoatividade natural proveniente do decaimento radioativo de isótopos de urânio, tório e potássio existentes no núcleo terrestre, o interior do nosso planeta apresenta-se ainda extraordinariamente quente, chegando a atingir valores da ordem dos 7000 ºC. As diferenças de temperatura existente entre as regiões mais internas e as mais externas do interior da Terra, levam à formação de correntes de convecção no material magmático, em tudo semelhantes às que podemos observar numa simples fritadeira ou em colunas de ar ascendentes na atmosfera.


 Observemos o famoso voo do condor, tantas vezes em grande altitude com a ajuda de correntes de ar quente ascendentes.


( C O N T I N U A )